PREFÁCIO

O casamento, divórcio e novo casamento, nas comunidades cristãs e entre os seus membros são o mote deste livro. Estes temas reflectem a vivência mais profunda do evangelho. Os relacionamentos são a base da vida cristã. Deus deu o exemplo, no maior de todos os mistérios, a Trindade. Para o ser humano, o casamento é o mais simples de todos os relacionamentos. Conhecendo os desígnios de Deus, temos a porta aberta para um verdadeiro manancial que é o poder de Deus para todo aquele que crê.

Sendo simples é, no entanto, de uma enorme complexidade, não devido à vontade de Deus, mas porque nós seres humanos gostamos de complicar ao querer afastar o criador da sua obra. A tentativa de independência leva a que quando chegam os momentos difíceis, mais uma vez não se quer que a resolução passe pela autoridade, mas pelo seu próprio entendimento.

O casamento cristão e a sua manutenção são loucura para os que não crêem e escândalo para outros.

Ao longo dos textos encontrará breves conselhos como se deve encarar o casamento. Como por exemplo: a ternura no casamento, a lealdade, a aliança, o relacionamento e o discernimento do casamento e muitos outros. Estas e outras considerações podem aplicar-se com a devida contextualização a qualquer área da vida cristã.
Nos livros, nas revistas ou jornais que li acerca do novo casamento de crentes que se divorciaram de outros crentes, encontrei dois pontos fracos em muitos deles.

O primeiro, é uma notável falta de convicções, escondidas em atitudes cobardes de confrontar interesses e medo de não ser aceite pelos outros.
O outro, uma total falta de sabedoria em encarar o casamento e de ensinar os jovens a analisar o que querem para a nova vida.

Jesus ensinou-nos que o normal nos relacionamentos é alguém tentar sempre dominar a situação. O casamento não é mais que um relacionamento com objectivos específicos, que une um macho e uma fêmea humanos, o qual devia ser para toda a vida.
Independentemente daquilo que os uniu, é certo que vão ter de viver em relacionamento íntimo, até que algo os separe.
O motivo porque a maioria dos casamentos falha é a sobreposição de interesses, que levam ao choque entre os cônjuges.
Os interesses podem ser nas mais diversas áreas, mas o conflito começa quando algum dos cônjuges se sente prejudicado.
O domínio e controlo da relação, se não for de comum acordo, leva à ruptura. Embora o normal seja os dois quererem o domínio, devia fazer parte do noivado a preparação dos objectivos comuns do futuro casal em vez de irem ao sabor da maré.

No Ocidente, durante um período temporal excessivamente grande, era normal que o papel activo do casamento pertencesse ao homem e que a mulher, aparentemente, tivesse um papel secundário. Isto levou a que a parte dominante exercesse um papel demasiado proeminente levando a abusos. A mulher tinha de aceitar de bom agrado tudo o que o marido fazia. Desde crianças que eram educadas para aceitar e viver com esta situação.
Com o avanço dos séculos, e com a libertação deste conceito retrógrado de domínio, (que se reflectia inclusivamente nos tipos de governo), o domínio e controlo do casamento passou a ter que ser dividido.

Hoje a norma é não aceitar o outro. Ninguém quer ceder e é costume encontrarem-se separações com argumentos do género: "que já não dá", "que não são compatíveis", "que já estão cansados", ou qualquer outra argumentação. O que querem dizer é que nenhum quer assumir que vai ceder.
Conheço relações duradoiras em que uma das partes, seja o homem ou a mulher, é o que “brilha” na família. A outra parte acaba por dominar a retaguarda. Se entenderem assim e se respeitarem mutuamente, podem viver uma vida de felicidade, pois vivem de acordo com a sua personalidade e com o acordo entre ambos.
Esquecemo-nos que até na vida é assim, uns querem ser famosos e estarem na ribalta, outros preferem servir o seu semelhante sem darem nas vistas. Se cada um soubesse o seu lugar, não haveria tantos conflitos.
Dentro do casamento, cada um deve conhecer os seus limites, a sua maneira de ser e até o que quer do próprio casamento. Por muito incompatíveis que sejam, se puserem o seu amor diante de Deus e estiverem dispostos a amar o cônjuge, certamente viverão com qualidade e a relação será duradoira.
O casamento é uma via com dois sentidos, os quais devem ser fluentes e sem congestionamentos.
Ainda hoje o casamento é um mistério que Deus deixou para a humanidade. Só conhecendo a Deus, é que se pode entender as razões que o coração desconhece.

Alguns dos textos são cartas que escrevi a amigos irmãos que estavam para casar e que me pediram aconselhamento. Outros ainda são fruto do meu trabalho com jovens e adolescentes.
Como as trocas de correspondência ocorreram com amigos chegados, os pensamentos foram íntimos, as frases são mais do que simples conjunto de palavras, muitas delas foram escritas com emoção, têm vida e a vida tem de ser interventiva. Sem convicções vive-se sem destino e quem não sabe para aonde vai, perde a cor e o sabor de viver.

Porquê o título “Cristo: Salvador ou Opressor?”.
Porque é a imagem que muitas pessoas transmitem de Cristo. Quando as coisas correm bem, os problemas são menores, resolvem-se facilmente e tudo é aceitável. Deus é amor, Jesus salva, cura e liberta, e muitas coisas mais. É a época do Cristo salvador.
O Cristo opressor é aquele que entra em choque com os desejos. O que se quer é diferente dos desejos de Deus. Deus é amor, mas limitador. Não se pode fazer o que se quer. Em último caso, os desejos de Deus, são regras difíceis de se cumprirem.
No casamento, o Cristo salvador é quando tudo corre bem e o cônjuge é uma dádiva de Deus. Quando chega a ruptura e se fica só e começa a surgir o desejo de uma nova relação, Cristo passa a ser opressor, pois não é justo, o justo ficar só e ter de lutar sozinho, etc., etc., etc.
Esta é a luta entre o Homem em Adão e o Homem em Cristo, é a luta entre a carne e o espírito.
Reconheço que, aceitar que só pode haver um novo casamento apenas por viuvez, é algo humanamente impossível de compreender e até de aceitar. Neste caso incluo também as experiências pré-matrimoniais e as experiências extraconjugais mesmo as de comum acordo e as tidas em conjunto.
Creio que a compilação dos textos que se seguem podem dar alguma luz sobre os temas do casamento, do novo casamento e esta luta entre a justiça de Deus e o conceito de justiça humanos.

Advertência:
Querer levar uma vida de discípulo de Cristo, ser cristão, mas sendo apenas simpatizante, é levar uma vida esquizofrénica cheia de sofrimento, dor, agonia, solidão, rancor, em que a própria existência em si é uma prisão.
Ser discípulo é viver na confiança de que o Poder de Deus é superior à compressão da natureza humana e que qualquer que seja a situação a Sua presença é suficiente.
Ser discípulo é sinónimo de viver em liberdade, mesmo estando presos a um corpo corruptível.